Foto: Daniel Croce
O show do Angra no Rock in Rio de 2015 foi importante por inúmeras razões. Primeiro teve o caráter reparador, quatro anos após o fiasco da apresentação de 2011. Segundo, marcou a partida, ainda não definitiva, do guitarrista Kiko Loureiro; Marcelo Barbosa (Almah) foi apresentado como substituto e tocou nas três últimas músicas do repertório. Por último, mas em hipótese alguma menos importante, os brasileiros tiveram a participação de dois decanos do metal mundial: Dee Snider, vocalista do Twisted Sister, e Doro Pesch. Na manhã seguinte ao show, recebo uma mensagem do Toninho Pirani, editor-chefe da Rock Brigade, informando que aquela que, não à toa, ostenta o título de Rainha do Metal estava disponível para uma entrevista presencial no hotel em que estava hospedada na Barra da Tijuca. Lá fui eu, acompanhado pelos colegas Gustavo Maiato e Victória Heloise, morrendo de cansaço após um dia inteiro de cobertura sob um sol inclemente, para um dos encontros com artistas mais memoráveis que já tive. Depois de meia hora de papo num espaço reservado no saguão do hotel, gravada em áudio para a posteridade, Doro me deu talvez o autógrafo mais bonito entre todos que coletei: "To Marcelo, all my love für immer". Disse a ela que era recíproco. Como não ser? Boa leitura!
Entrevista
originalmente publicada na Rock Brigade Magazine em 27 de janeiro de 2016.
Marcelo Vieira: Como
aconteceu o convite para participar do Rock in Rio?
Doro Pesch: Recebi um telefonema cerca de um ano
atrás perguntando se eu gostaria de cantar em “Crushing Room” [música do mais
recente álbum do Angra, “Secret Garden”, lançado em dezembro de 2014]. Ouvi a
música, pensei “uau!” e aceitei o convite. Meses depois, o empresário do Angra me
convidou para participar do show que a banda faria no Rock in Rio. Ele disse
que Dee Snider talvez participasse também e [sugeriu] que talvez cantássemos
“We’re Not Gonna Take It” [do Twisted Sister] juntos. Eu já havia cantado [essa
música] uma vez, em Nova York, e a resposta do público é fantástica! É um hino!
MV: E como foi cantar
“Crushing Room” ao vivo?
DP: Nossa, foi demais! Na véspera do
show, nós participamos de um programa de TV [Encontro com Fátima Bernardes, da
Rede Globo], e este foi meio que o nosso primeiro ensaio. Aí, no dia do show,
nós repassamos a música no camarim minutos antes de subir ao palco. Mas eu
estava confiante. Era muita adrenalina, sabe? Cantar no Rock in Rio para mim
era inacreditável. Era algo que eu sempre quis, um sonho. Na Alemanha, nós
temos o Wacken, que é meio que a Meca para o público headbanger. Já o Rock in
Rio é um festival para todos os públicos, e todo o mundo conhece ou já ouviu
falar dele.
MV: O você achou da
recepção do público a “Crushing Room”?
DP: Bem, cantar uma balada num show de
festival é meio arriscado. Às vezes quando canto no Wacken, por exemplo, não
incluo nenhuma balada no repertório. Mas teve uma vez que a organização do
festival promovido pela [revista] Rock Hard nos pediu para tocarmos um setlist
só com músicas dos anos 1980 em que ficamos em dúvida se deveríamos ou não
incluir “Für Immer” [balada que encerra “Triumph and Agony”, disco do Warlock
lançado em 1987]. A princípio a deixaríamos de fora, até que, na véspera do
show, tive um estalo e resolvi incluí-la... E acabou sendo um dos pontos altos
daquele show! “Crushing Room” veio no meio do setlist. É uma música que possui
energia, profundidade e as pessoas podem cantá-la junto. Não dá para
compararmos com um hino, mas pude ver muita gente soltando a voz conosco!
MV: Outros artistas que
entrevistei anteriormente disseram que a maneira que o público headbanger
brasileiro se entrega nos shows é surpreendente. Você concorda?
DP: Concordo totalmente. Na América do
Sul, especialmente no Brasil, as pessoas têm uma paixão que é como uma chama
acesa. É algo que está no sangue, aquele “olé olé olé”. É por e para essas
pessoas que eu canto e sigo fazendo músicas. É fantástico quando você dá 100%
de si em cima do palco e recebe 200% de volta. Foi Schmier [do Destruction]
quem me deu a dica. Ele me perguntou se eu já tinha ido à América do Sul e tal,
eu respondi que não, e ele falou: “Bem, quando você estiver lá, vai ficar
boquiaberta e vai se lembrar do porquê de ter começado a tocar heavy metal.” Confesso
que não entendi muito bem o que ele quis dizer com isso, até que vim para a
América do Sul e compreendi exatamente o que ele estava querendo dizer. É muito
gratificante poder tocar para pessoas que realmente abraçam o metal como um
estilo de vida.
MV: Isso porque o
Brasil passou muitos anos fora do mapa das grandes bandas do metal mundial. Deu
para perceber isso na sua primeira vinda ao país, em 2006?
DP: Quando vim me apresentar no Live N Louder,
eu não fazia ideia de que o Warlock e eu éramos tão populares por aqui. Hoje em
dia, ok, você tem a Internet e tal. Mas nos anos 80, só havia as revistas. Vi
pessoas exibindo pôsteres com imagens da época. Levamos muito tempo para vir ao
Brasil porque antigamente toda essa coisa de promoters era muito complicada.
Por outro lado, só em meados dos anos 90, o Sepultura e o Angra, enquanto as
duas bandas brasileiras que realmente conseguiram fazer seu nome ser conhecido
ao redor do mundo, ajudaram a incluir o Brasil na rota das bandas
internacionais.
MV: Depois de trinta
anos de carreira, ainda há montanhas a serem escaladas?
DP: Todo mundo que canta ou toca heavy
metal tem seus ídolos e sonha em um dia cantar ou tocar ao lado deles. Confesso:
estávamos nos preparando para tocar num festival na Áustria quando o meu
baterista me chamou “Doro! Doro! Tem uma pessoa aqui querendo falar com você!”.
Pensei, “P*rra, quem seria a uma hora dessas?”. Era Rob Halford! Eu mal podia
acreditar! Mas no fim das contas, tudo é sempre um novo desafio. Cada festival,
cada turnê, cada álbum, e eu quero dar o meu melhor em tudo que eu puder. Digo
que o álbum seguinte sempre será a coisa mais importante a ser feita.
MV: O que podemos
esperar da Doro para 2016?
DP: Estou para lançar um DVD em março
para celebrar os trinta anos de carreira. Se chamará “Strong and Proud: 30
Years of Rock and Metal”. A arte de capa é do Geoffrey Gillespie, o mesmo de “Triumph
and Agony”. As gravações foram feitas em muitos shows. Tivemos a participação
do Udo [Dirkschneider] cantando “Balls to the Wall” e “Fast as a Shark” [do
Accept]. A tracklist já está definida e está repleta de clássicos!
MV: E qual desses
clássicos você mais gosta de cantar ao vivo?
DP: “Für Immer” e “All We Are”, porque
me lembram da época mágica que foram os anos 80. Foi o pontapé inicial da minha
carreira e o clipe [de “All We Are”] era figurinha certa na programação da MTV.
Onde quer que eu vá, as pessoas lembram da música e do clipe. Infelizmente,
canais de videoclipes não são mais populares como eram antigamente. Já “Für
Immer” foi o nosso segundo clipe [daquele álbum] e foi curioso porque era uma
balada que não era cantada totalmente em inglês; era alemão e inglês. Fiquei
muito feliz, apesar da maioria das pessoas não fazer a menor ideia do que eu
estava cantando. Toda hora eu tinha que explicar que “Für Immer” equivale a
“Forever”. Então, enquanto “Für Immer” é aquela canção que toca as pessoas lá
no fundo, “All We Are” as faz se sentirem bem, enlouquecer e soltar a voz.
Doro manda bem. os discos recentes acabaram sendo meio repetitivos, na minha opinião, mas reconheço a importância dela para a cena. Preciso ver um show ao vivo dela para aumentar meu carinho pelos álbuns recentes.
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