ENTREVISTA: Guilherme Sevens e Phil Drigues falam sobre a vida após o Painside no comando do Gargant

Enquanto integrantes do Painside, Guilherme Sevens e Phil Drigues chegaram mais longe do que a maioria dos músicos independentes da cena underground carioca poderia sonhar. Mas ter um disco de repercussão internacional, com participação especial de ícone do metal, e fornecer a trilha sonora para um astro em ascensão na luta livre — a faixa “God Made Me Unbreakable”, que traz participação de Jean Dolabella (Ego Kill Talent), foi adotada pelo lutador Ronnys Torres nos tempos de Jungle Fight e o acompanhou até a chegada no UFC — não pareceu ser o bastante para dissuadir a banda de entrar num hiato, a priori, por tempo indeterminado. 

Com muito mana para gastar e tendo a pandemia lhe incendiado a veia criativa, a dupla resolveu formar o Gargant. Os primeiros sons divulgados nas plataformas digitais — “Pilgrim and the Beast” e “The Scythe and I” — jogaram as expectativas tão lá no alto que eu quis logo saber o que vem a seguir. Descubra isso e muito mais no bate-papo abaixo.

Boa leitura!

Transcrição: Leonardo Bondioli

Fotos: Divulgação / The Bridge Press

Marcelo Vieira: Queria começar perguntando pra vocês, por que assim, eu fiquei sabendo da existência do Gargant há muito pouco tempo, eu vi que vocês botaram um projeto na rua agora em 2022 mesmo. Esse projeto de vocês, ele é mais um resultado do hiato em que se encontra o Painside ou é um resultado direto da pandemia? O que influenciou mais vocês a criarem isso?

Guilherme Sevens: Cara, eu posso dizer que na verdade foi a mistura dos dois, porque o Painside já vinha num hiato num momento antecedente à pandemia, então não foi a pandemia que causou o hiato do Painside. Aí, eu e o Phil, a gente tentou seguir, se manter na parte criativa do heavy metal que a gente tanto ama e até tentou montar de alguma forma que desse certo algum projeto musical, até envolvendo outras pessoas etc. Só que o que que acontece, acabou que, isso eu tô falando no momento inicial já da pandemia, então acabou que aquela dinâmica tradicional de ensaio e encontros, principalmente naquele início, foi diretamente impactado. Então a gente tentou iniciar, mas não conseguiu desenvolver, porque não dava pra ensaiar, a coisa que parecia que ia durar três meses se estendeu e continuou aí num momento mais ou menos delicado, e aí nesse meio-tempo eu resolvi voltar a tocar guitarra, desenvolver no baixo também e compor. E aí as músicas começaram a surgir e tal, e como a gente faz tudo cem por cento de casa, tudo foi gravado nas nossas casas, a gente não saiu nem pra ensaiar nem pra compor de jeito nenhum, e aí a coisa foi tomando forma até resultar nesses dois singles que a gente lançou.

MV: A ideia do Gargant, pelo menos no que li no material que eu recebi, era se distanciar do estilo que meio que consagrou o Painside. Eu quero entender. Vocês estavam meio cansados desse estilo em si ou apenas cansados de estarem engessados em um estilo só e de repente a fim de uma nova empreitada que permitisse vocês expandirem esses horizontes musicais?

GS: Na verdade o único afastamento que teve em relação às composições do Painside foi mais na fase final que ele era já bastante calcado no metalcore. Mas revisitando o início do Painside, onde a gente teve a oportunidade de lançar o “Dark World Burden” (2010), que foi nosso primeiro álbum lançado por uma gravadora sueca chamada Inner Wound Recordings, a gente tinha os dois pés cravados no metal tradicional, tanto que a gente teve oportunidade de ter o Chris Boltendahl do Grave Digger cantando no álbum, o Gus Monsanto, que na época era do Revolution Renaissance, que tinha sido recém-formado pelo Timo Tolkki do Stratovarius, então nessa fase, que era entre 2008 e 2010, era bem calcado. E aí completando essa parte do estilo do Gargant em si, é porque a gente é muito fanático por metal anos 1980 e 1990, então ele justamente vem com essa proposta de resgatar especialmente esse heavy metal que já misturou power metal americano, que é uma abordagem mais pesada do heavy metal tradicional.

MV: E quais bandas ou estilos compõem esse panorama musical de vocês? Você citou os gêneros, mas, “pra dar nome aos bois”, quais seriam as bandas que vocês têm na cabeceira de vocês?

Phil Drigues: Eu sou o cara que escuta de tudo, mas, assim, no segmento rock/metal em geral, de batera/composição, Kiss em primeiro lugar, que foi a banda que me fez tocar bateria, lá nos anos 1980 com Eric Carr, Iced Earth, Savatage... Cara é muita coisa, dessas bandas de heavy metal tradicional dos anos 1980, anos 1990... Quase tudo! É difícil ter uma banda que eu não curta pelo menos alguma coisa, algum álbum, difícil eu dizer “pô, odeio essa banda”, é muito difícil, a gente gosta muito de metal, se você vir minha coleção aqui você vai entender isso, tem de tudo, e não só heavy metal tradicional, death metal, thrash metal. Eu tenho escutado muito Testament, Exodus, sempre escutei, mas que eu tenho escutado mais hoje em dia, Metal Church eu tenho escutado demais, e é por aí. E eu acho que o Guilherme é mais ou menos por aí também, não é, Guilherme?

GS: Sim, com certeza. Só não poderia deixar de acrescentar Iron Maiden, que é minha banda de cabeceira desde os doze anos de idade, obviamente Bruce Dickinson solo, e como o Phil falou, eu sou muito fã dessas levas americanas que trazem o power metal americano com a melodia do heavy metal. Então passando por Iced Earth até coisas mais recentes como Trivium, uma parte ali do Bullet For My Valentine também, dessa parte mais moderna, ele tem uma parte da carreira que foi pro lado do thrash, mas já mudou de novo, voltou mais pro metalcore, mas tem muitas coisas que são bem inspiradoras.

• Assista ao videoclipe oficial de “Pilgrim and the Beast” no YouTube.

MV: Durante esse processo do Gargant vocês fizeram alguma descoberta musical ou descobriram dentro de vocês mesmos alguma faceta artística que não sabiam que existia?

PD: Acho que não, porque, eu, pelo menos, tô há tanto tempo nisso que pra mim foi bem natural. As composições vêm mais do Guilherme, ele é o cara que toca tudo de corda e faz as melodias, voz e tudo mais e eu acrescendo a “pancadaria”, digamos assim. Então como eu já tô muito acostumado com isso, na verdade eu acredito que foi bem natural pra mim, ele jogava as ideias e eu assimilei muito bem, gostei muito, foi uma coisa muito rápida. Eu gravo as coisas aqui em casa mesmo, então ele mandava uma ideia e na mesma hora eu subia já com a cabeça fervendo e gravava uma resposta, era tipo uma troca de figurinhas, ele mandava pra mim uma ideia de guitarra com alguma melodia de voz e eu falava “pô cara, vou subir agora e botar batera nisso aí”. Eu subia, gravava uma parada e mandava pra ele de volta e foi muito bem e muito rápido, quando nasce a ideia, ela vai muito rápido, ela pode demorar um pouco pra nascer, mas depois que vai é bem natural.

MV: Eu queria saber quais são os prós e os contras de concentrar todo o trabalho só na mão de vocês, por que vocês estão compondo, gravando, produzindo, divulgando e fazendo tudo por conta própria. Não fica uma carga muito pesada em algum momento?

GS: Cara, fica, mas eu acho que o prazer e especialmente o amor ao estilo, ao heavy metal, ele que sustenta tudo isso, então acho que, se ele não fosse maior que todos esses, entre aspas, perrengues, não daria pra fazer. Então eu sou um cara que gosto muito da parte criativa, até por conta da minha profissão, por eu ser designer, então eu tenho oportunidade também de fazer as nossas artes, de editar nossos vídeos, de contar com parceiros incríveis pra realização desses projetos, como foi o vídeo da “Pilgrim and the Beast”. Então é uma máquina que não para e que realmente fica limitada somente ao tempo de executar todas essas partes, mas como eu te falei, é o prazer que sustenta, mas que é pesado, é. [Risos]

MV: É a ideia do Gargant focar nos singles pra extrair o máximo de cada música que vocês fizerem ou tá nos planos de vocês concentrarem, gravarem um álbum, reunir um repertório pra fazer um álbum fechadinho e tal?

PD: Eu acredito que seria mais fácil, inclusive, já que a gente já começou com isso, continuar lançando os singles e quem sabe no futuro pegar e fazer um apanhado do que já tem lançado, pegar mais algumas inéditas e fazer um álbum, um EP ou alguma coisa do tipo. Eu e o Guilherme somos colecionadores de CD, eu sou colecionador de vinil, de K7 desde moleque, então eu tenho essa vontade de lançar isso fisicamente, e o Guilherme também, a gente tem pensado bastante nisso. Agora eu realmente não sei, porque depende muito das composições começarem, a gente já tá com algumas caminhando, e vamos ver como isso vai fluir pra ver se vamos lançar mais.

GS: Na verdade, a resposta mais precisa pra isso é que, na verdade, é um tópico sempre em discussão, então quando a gente sentir que tem um apanhado bacana de músicas que fazem sentido entre si, a gente com certeza vai lançar o físico por esses motivos que o Phil falou, a gente é colecionador, a gente valoriza muito.

MV: Somos três então. [Risos]

GS: Pois é! A gente não vai escapar, é porque o Gargant, é até engraçado, ele nasceu, mas ele tá em desenvolvimento. Primeiro a gente não existia, eu não tocava guitarra há muitos anos já, eu retomei essa atividade com o Gargant, eu passei também a fazer as gravações do baixo com o Gargant, então o que era antes um plano pra lançar um single virou dois, agora a gente já tem uma penca de composições já engatilhadas. E aí a dúvida no momento é: a gente junta tudo e lança um álbum ou a gente continua servindo aos poucos? Então é muito freestyle nesse sentido.

MV: A repercussão dessas duas músicas que vocês lançaram até agora meio que podem servir de termômetro pra isso. Como é que tem sido a repercussão delas? Público e imprensa.

GS: Tem sido incrível, até surpreendente, porque como a gente chegou, apesar de termos toda uma história que precede o Gargant com o Painside e o Phil envolvido não só com o Painside mas com o Black Priest e N outros projetos que ele tá envolvido, nós somos novatos na cena. Então a gente se sentir acolhido pela comunidade que a gente tanto curte fazer parte é muito especial, e é isso que no final das contas faz a gente pensar em como seguir, “será que já vale a pena juntar as composições que já estão tão quentes e lançar o próximo álbum já completo ou a gente continua na vibe original de singles?”, então tá sempre em construção.

MV: E por se tratar de um duo, vocês pensam em levar isso pro palco de alguma forma, chamar uma galera pra tocar com vocês ou tá tranquilo permanecer como um projeto de estúdio mesmo?

GS: Então, depois eu vou até deixar o Phil complementar, mas, trazendo a ideia principal, é que a gente tem uma abordagem um pouco diferente das dinâmicas que as bandas em geral levam. Então, por exemplo, a gente não ensaia, a gente não se encontra ao vivo pra tocar, então ele nasceu mais pra ter uma relação de pertencimento à cena de heavy metal, por isso que a gente faz questão de nas redes sociais estar sempre compartilhando de forma muito entusiasmada nossa coleção, falando de outras bandas, em vez de compartilhar somente conteúdo sobre o Gargant. Então o que eu quero dizer com isso é: a gente tem uma abordagem diferente de trabalho do qual ela nasceu não envolvendo o palco, justamente pela natureza do duo, que aí sim a gente precisaria ter um line-up completo pra poder reproduzir as músicas de forma adequada então, no momento, não temos previsão, mas com certeza é algo que tá em discussão pra em algum momento ocorrer.

• Assista ao lyric video oficial de “The Scythe and I” no YouTube.

MV: Tenho mais duas perguntas, a primeira delas é um pouco polêmica. Eu queria saber o seguinte, esse hiato do Painside é um eufemismo pra “a banda acabou por hora” ou na cabeça de vocês é certo em algum momento retomar as atividades?

GS: Não sei. [Em tom de brincadeira]

[Todos riem]

PD: E nem eu! [Risos]

GS: Se você souber, então me fala depois. [Risos]

PD: Bom, a hora que os caras quiserem eu tô aqui, porque eu entrei na banda depois como fã, então eu tô à disposição dos caras, é com eles.

MV: É uma questão de agenda ou de conciliar interesses?

GS: Eu acho que a falta de agenda começou a esbarrar no interesse, porque o nosso líder sempre foi o Carlos Saione, que era o compositor principal, e pra ele começou a pegar mais, e sendo bem sincero, sem ele não faz sentido pensar.

PD: E outra coisa que eu acho interessante falar também é que, quando eu entrei na banda, a gente demorou a engrenar, e quando a gente conseguiu finalmente, que a gente estava fazendo shows, a gente começou a fazer shows em 2018, aí fizemos alguns shows em 2019. O último show nosso foi em outubro de 2019, se não me engano, aí logo depois veio a pandemia, então pelo menos pra mim foi um balde de água fria pesadíssimo, porque foi difícil botar pra engrenar uma banda que já estava parada, a gente voltou e conseguiu, de certa forma, cativar aquele público que a gente já tinha, principalmente aqui no Rio de Janeiro, que é bem grande, e estava indo bem, aí do nada ter que parar é foda. Pro Painside eu achei que a pandemia foi bem letal. E sem o Carlos, como o Guilherme falou, realmente não tem por quê.

GS: O Painside nasceu comigo e com o Carlos, a gente se conhece desde criança, desde 2001 que a gente se conhece, e aí realmente as questões da vida e prioridades acabaram pesando muito nisso. Quando vem uma pandemia ou algumas questões de agenda mais severas, acabam se tornando letais.

MV: Pra encerrar, o que vocês podem antecipar que vai vir pro Gargant nos próximos meses? Já tem música nova pra ser lançada? Vai ter merch à venda?

GS: Tudo, vai ter tudo, é um grande parque de diversões do metal. Então como as decisões são tomadas muito rápidas, justamente uma das coisas que é o super pró de ser uma dupla, é um ter ideia, concordou, foi, o outro não concordou acabou a dupla [Risos]. Eu e o Phil, a gente é muito elétrico, muito cheio de ideia o tempo todo então pode vir até um álbum, então vai ter no mínimo mais singles, no máximo o álbum e uma cacetada de merch.

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