Poucos artistas conseguem transmitir tanto com suas canções quanto Jake Smith, o The White Buffalo. Com uma voz poderosa e letras carregadas de emoção, ele tem conquistado uma base sólida de fãs ao redor do mundo, especialmente graças ao impacto de sua música em produções audiovisuais como Sons of Anarchy, The Punisher e This Is Us. Apesar de sua música transcender formatos, Smith se mantém genuíno e focado em sua arte, algo que ele define como “seguir suas próprias regras”.
Nesta conversa, Smith, que vem ao Brasil para seis apresentações, reflete sobre a importância das trilhas sonoras em sua carreira e compartilha histórias curiosas, como a vez em que assistiu a Californication com os pais e enfrentou uma cena constrangedora ao som de uma de suas músicas. Ele também fala sobre a liberdade criativa que alcançou após o lançamento de seu último álbum, “Year of the Dark Horse” (2022), além de seus planos para o futuro, que incluem explorar novos caminhos musicais sem se limitar a rótulos.
Por fim, The White Buffalo demonstra uma sensibilidade única, equilibrando autenticidade artística com a valorização da família e das relações humanas. Em um mercado saturado de tendências fugazes e promoção incessante nas redes sociais, ele escolhe trilhar um caminho próprio, provando que é possível criar uma carreira sólida e marcante sendo fiel a si mesmo. Exemplo.
Boa leitura!
Por Marcelo Vieira
Fotos: facebook.com/thewhitebuffalomusic
Primeiramente, quais são suas expectativas para a turnê no Brasil? É sua primeira vez no país, né?
Sim, é minha primeira vez, e, honestamente, não faço ideia do que esperar. Estou animado porque, no início, eu realmente não sabia o quão real era nossa base de fãs no Brasil, se as pessoas comprariam ingressos ou compareceriam aos shows. Você nunca sabe até o dia do show, sabe? Então, apostamos nisso, e parece que estamos indo bem, aumentando o tamanho dos locais e tocando em clubes maiores do que inicialmente imaginávamos.
Sobre as expectativas, só ouvi coisas incríveis sobre o Brasil e os fãs brasileiros. Já estive em muitos lugares do mundo, e há locais onde a energia do público é realmente diferente. Nos Estados Unidos, por exemplo, leva mais tempo para engajar as pessoas, enquanto em países como Espanha, basta uma palma para todo o público entrar no ritmo. Minhas expectativas estão altas, mas sempre tento mantê-las baixas para me surpreender. Estou muito empolgado para chegar aí.
Você com certeza ficará surpreso com o público daqui. Pelo que lê ou vê nas redes sociais, quais são suas impressões sobre os fãs brasileiros?
Minha principal conexão com os fãs brasileiros é pelas redes sociais, e sei que eles são muito ativos por lá. O que ouço é que são incrivelmente entusiasmados. O termo “fã” vem de “fanático”, e parece que essa paixão é incomparável no Brasil. Dizem que é um dos públicos mais animados e receptivos do mundo, algo que ouço de todos que tocam aí. Só tenho ouvido coisas boas.
Já ouviu alguma banda ou artista brasileiro?
Boa pergunta! Às vezes, não sei de onde são as bandas que escuto. Quando gosto muito de um grupo, costumo pesquisar bastante, descobrir de onde são, quem produziu os álbuns e tudo mais. Mas, pensando agora, não sei se conheço alguma banda brasileira. Pode me dar um exemplo?
Sepultura.
Ah, sim! Conheço o nome, claro. Não sou muito ligado em metal, mas na época do colégio eu ouvia mais esse estilo. Tenho certeza de que já escutei algumas músicas deles, mas faz muito tempo.
Há algo específico da cultura brasileira que você está animado para conhecer? Talvez as churrascarias? [Risos.]
Com certeza, adoro um bom churrasco! [Risos.] Alguém me falou sobre um corte de carne diferente que não temos aqui nos Estados Unidos, mas não lembro o nome. Vou precisar perguntar de novo. Estou empolgado para comer bem, sentir a cultura e explorar as cidades.
Para mim, o melhor de estar na estrada é ter a chance de vivenciar diferentes culturas, tanto tocando para pessoas de diversos lugares quanto aproveitando o tempo livre. Não sou muito fã de pontos turísticos clássicos, tipo visitar grandes monumentos. Prefiro sair, comer, beber algo, interagir com as pessoas e sentir a energia das cidades. É assim que gosto de explorar os lugares por onde passo.
Quanto aos shows, o que podemos esperar do setlist?
Provavelmente faremos uma mistura de tudo. Já se passaram alguns anos desde nosso último álbum, e nunca fomos uma banda que toca todo o disco novo de uma vez. Sempre tento equilibrar: algumas músicas são essenciais e as pessoas esperam ouvi-las, então tocamos essas. Fazemos um mix de várias fases do catálogo.
Normalmente tocamos entre 20 e 25 músicas por noite, então é preciso selecionar bem. Não somos uma banda de rádio, não temos “hits”, mas é evidente que algumas músicas funcionam melhor ao vivo e têm uma conexão especial com o público. Tentamos capturar isso no setlist.
O seu trabalho mais recente é o álbum “Year of the Dark Horse”. Segundo uma declaração sua à época do lançamento do disco, há elementos e influências de Daniel Lanois, Tom Waits, The Boss, circo, música pirata, iate rock... o que o motivou a explorar tantos novos sons?
Eu realmente queria criar um álbum que fosse como uma experiência para se ouvir de fones de ouvido. Algo que você coloca para tocar e que te leva em uma jornada, tanto sonora quanto liricamente. Acho que isso está se perdendo atualmente. Minha intenção era que cada música fluísse para a próxima, explorando diferentes gêneros. Trabalhar com o produtor Jay Joyce foi essencial nesse processo. Ele não só é um produtor incrível, mas também um músico extraordinário, capaz de nos ajudar a expandir nossas ideias e sons. Não penso muito em gênero ao criar música; na verdade, nunca foi algo importante para mim. Sempre misturei diferentes estilos e tento fazer com que soe autêntico. Mas, nesse álbum, Jay conseguiu levar essas ideias ao extremo, usando diferentes instrumentos e técnicas de gravação. Foi uma experiência de aprendizado incrível.
Como foi a experiência de gravar em Nashville? A cidade influenciou o som do álbum de alguma forma?
Eu escrevi a maior parte do álbum enquanto estava em Nashville. Algumas ideias já existiam, mas muitos arranjos ainda estavam em aberto. Estar isolado em uma casa com a banda por duas semanas, sem distrações de família ou amigos, tornou o ambiente quase como um personagem adicional no processo criativo. Essa pressão para criar em um período limitado funciona bem para mim, embora seja um jeito meio caótico de viver e trabalhar.
Quanto à influência musical da cidade, honestamente, o “country” moderno de Nashville, que é tão pop, quase não me impacta. Na verdade, acho que o cenário atual da música me irrita um pouco; muitas coisas parecem superficiais. Sempre tento criar algo que toque emocionalmente ou faça as pessoas pensarem, ao invés de contribuir para esse “rebaixamento” musical que vejo acontecer.
Você meio que antecipou uma das minhas próximas perguntas: o que te inspira a escrever música?
Essa é uma pergunta que surge o tempo todo, e, sinceramente, eu não tenho uma resposta definitiva. A inspiração geralmente não vem de um lugar específico, como uma notícia ou algo que eu li. É raro. A maioria das ideias parece simplesmente surgir do nada. É como se eu fosse uma antena captando algo, e o que me inspira é reconhecer quando uma dessas ideias chega. Pode ser uma frase, uma melodia, algo que surge do nada. A parte mais emocionante é esse momento inicial, quando você percebe que tem algo ali. Muitas vezes, só entendo sobre o que escrevi depois que tudo está pronto. No último álbum, por exemplo, percebi que várias músicas eram, na verdade, reflexões pessoais disfarçadas. Então, mesmo que o ponto de partida seja “criado”, ele acaba se tornando pessoal em algum nível.
Essa abordagem para a escrita evoluiu ao longo da sua carreira? O que você diria que mudou desde seus primeiros trabalhos?
Não tenho certeza de quanto evoluí. Acho que melhorei na construção de músicas, mas sempre tento me manter no desconhecido, sem saber exatamente o que estou fazendo. Essa abordagem crua e espontânea sempre funcionou para mim. Ao longo dos anos, ganhei mais experiência de vida para explorar nas letras, mas, por outro lado, sinto que estou “regredindo” em alguns aspectos – o que é algo positivo. Há uma pureza em não saber exatamente o que algo significa, permitindo múltiplas interpretações. No passado, algumas letras minhas eram quase enigmáticas, e hoje tento tornar cada palavra mais significativa. Mas também é interessante olhar para trás e se perguntar: “O que eu estava pensando aqui?” Acho que isso reflete o ciclo da vida: você aprende, melhora, mas também perde um pouco daquela ingenuidade criativa que pode ser tão poderosa.
Sua música foi destaque em várias séries de TV. Como é para você ver suas canções em produções audiovisuais?
Não é algo que me afeta profundamente. Eu sei que isso impactou minha carreira, porque essas colocações foram talvez o maior motor para espalhar minha música globalmente. Não somos uma banda de rádio; a popularidade dos programas e os usos das músicas ajudaram a levar as pessoas a ouvirem o que fazemos. Escrevo canções emocionais com algo a dizer, e isso nem sempre é ideal para licenciamento, mas tive sorte de terem usado meu trabalho. É interessante perceber que, para muitos brasileiros, o motivo de me conhecerem provavelmente se deve a séries como Sons of Anarchy ou The Punisher, mas principalmente Sons of Anarchy. Eles usaram tantas músicas minhas e até me colocaram cantando em algumas delas, o que foi enorme para mim.
Você já descobriu algum artista ou banda através de uma série de TV ou filme?
Com certeza, embora eu não consiga lembrar de um nome específico agora. Sempre faço isso. Antigamente, você tinha que esperar os créditos para descobrir a música, e torcer para ter entendido bem a letra ou o título. Hoje temos o Shazam e o Google, então é bem mais fácil. Isso acontece frequentemente e é uma maneira importante de descobrir música.
Você assistiu a Sons of Anarchy, Californication ou This Is Us — três séries muito populares no Brasil?
Ah, elas também são populares no Brasil? Talvez eu precise mudar o setlist, então! [Risos.] Eu assisti Sons of Anarchy do começo ao fim. Já Californication foi uma situação engraçada: eu estava assistindo com meus pais, e a cena era de um cara saindo de uma banheira de hidromassagem enquanto recebia um sexo oral. Logo depois, o RZA, do Wu-Tang Clan, aparece agarrando uma garota ao som de uma música minha. Foi bem desconfortável. Já This Is Us, eu talvez tenha visto alguns episódios, mas acho que não cheguei a ver o que incluía minha música.
Quais são seus planos para o futuro? Algum novo álbum ou colaboração em vista?
Sim, estou começando a compor. O último álbum saiu no final de 2022, então já é hora. Também estou animado com o lançamento do álbum ao vivo, que entrega versões cruas e emotivas das músicas. O vinil está saindo agora e o streaming virá em breve, antes de chegarmos ao Brasil. Quanto ao futuro, não tenho uma direção fixa; quero criar ideias e ver onde elas me levam, sem pressão. Depois do último álbum, sinto que posso fazer o que quiser: talvez algo acústico, com cordas ou até uma ópera rock. As possibilidades são infinitas.
Por fim, como gostaria de ser lembrado como músico?
Eu realmente não me preocupo muito com isso. Gostaria de ser respeitado como compositor, alguém que seguiu suas próprias regras e caminho. Não gosto de coisas artificiais ou de seguir tendências. Isso pode ter prejudicado minha carreira às vezes, mas valorizo equilíbrio e autenticidade. A forma como fazemos turnês é um reflexo disso. Não ficamos na estrada por meses a fio porque família é importante. Meu baterista está comigo há 22 anos, e temos uma estabilidade na banda que muitos grupos não têm. Prefiro preservar isso a seguir o modelo agressivo de “atacar enquanto está quente”. O equilíbrio sempre foi essencial para mim.
Confira as datas da turnê de The White Buffalo no Brasil:
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